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os beatles - robert benayoun

Atualizado: 16 de set. de 2021


Robert Benayoun, Sem título, 1961. Collage sobre papel, 17,8 × 20,3 cm. Coleção privada, Londres. © Estate of Robert Benayoun.
 


A Fresta é uma coluna — uma colina — de periodicidade semanal dedicada a publicação de textos realizados no seio do movimento surrealista e arredores, de curadoria de Natan Schäfer.

 

N’A Fresta desta semana apresentamos um trecho de uma carta inédita em português de Robert Benayoun (1926 - 1996) dirigida a André Breton na qual, dentre outras coisas, o primeiro compartilha seu entusiasmo pelos livros de John Lennon [1]. Com esta carta, Benayoun estabelece uma correia de transmissão entre o movimento surrealista e o quarteto de Liverpool. Robert Benayoun foi um dos surrealistas mais anglófonos do grupo de Paris do pós-guerra. O domínio da língua inglesa sem dúvida contribuiu para seu envolvimento com o nonsense, ao qual dedicou notáveis obras como Les dingues du Nonsense: De Lewis Carroll à Woody Allen [2]. Porém, foi como crítico de cinema que Benayoun ganhou notoriedade, sendo um dos principais nomes da revista Positif, antípoda da famigerada Cahiers du Cinéma. Foi a partir desta atuação que ele envolveu-se em grandes polêmicas com os principais diretores da Nouvelles Vague, a cujo líder, Jean-Luc Godard, direcionou as mais cáusticas críticas, jamais escondendo seu profundo desapreço pelos filmes de Godard, proporcional ao seu fascínio pela cinematografia de Alain Resnais, Tex Avery, Jerry Lewis, Woody Allen e outros. Benayoun é autor de Le Dessin animé après Walt Disney (1961), um dos primeiros — senão o primeiro — livro sério sobre desenhos animados publicado na França. Também assina o seminal L’érotique du surréalisme (1978), sem dúvida um dos melhores estudos sobre o erotismo no movimento surrealista. Além de seus escritos, Benayoun deixou uma obra breve obra cinematográfica, na qual destacam-se os filmes Paris n’existe pas (1969, estrelado por Serge Gainsbourg) e Sérieux comme le plaisir (1975, estrelado por Isabelle Hupert, Jane Birkin e Serge Gainsbourg). Seu documentário Le surréalisme, sobre o grupo de Paris do movimento surrealista, jamais foi concluído, contudo, alguns trechos originalmente gravados para o documentário podem ser conferidos no documentário Passage Breton (disponível online). A maior parte da sua obra plástica, assim como poética, encontra-se dispersa e inédita. Do pouco publicado em livro, destacamos o magnífico Bouillon d’onze heures [3], espécie de bestiário prefaciado (e, dizem, intitulado) por Benjamin Péret. Até onde temos notícia, a única publicação de Robert Benayoun no Brasil é A erótica do surrealismo, o qual encontra-se na revista-catálogo A Phala, publicada por seu amigo Sergio Lima em 1967. * Paris, 3 de julho de 1965 [...] Você leu (sei que lhe enviaram) o livrinho de John Lennon intitulado Em flagrante delírio? [4] Eu acho-o de fato genial, assim como A spaniard in the works, o segundo volume do autor, que poderia ser traduzido por O fidalgo na fábrica. John Lennon, talvez você o saiba, é um dos quatro Beatles, ou seja aqueles que, na geração jovem, mais se aproximam dos Marx Brothers [5]. Os Beatles são os responsáveis por uma pequena revolução que, como quem não quer nada, chacoalha a juventude do mundo inteiro. Com suas músicas, que exprimem a erotomania sentimental dos jovens, e seu humor, proletário e iconoclasta, influenciaram, no sentido da irreverência e da reivindicação, os adolescentes alemães, italianos, poloneses, checos, espanhóis, franceses ou americanos. Nos Estados-Unidos, a grande imprensa fala de uma “renascença explosiva da extrema-esquerda”, fazendo notar que a juventude considera muito morno e ultrapassa o Partido Comunista americano . Ora, tudo isso vem da Inglaterra. Os “jovens furiosos”, algo curioso, só podem agarrar-se aos Beatles e aos ritmos de rock. O movimento beatnik já não representa absolutamente nada. Em flagrante Delírio não expressa diretamente este frenesi inesperado. Os Beatles, sabemos, funcionam a quatro como um circuito vibracional, para não dizer como um cataclisma, mas este livrinho situa bem o humor de John Lennon, o mais articulado dos quatro. Ele reconhece ter sido influenciado por Lewis Carroll e Edward Lear, mas ignora completamente J. Joyce. Para um jovem operário de Liverpool sem instrução [6] nem ambições literárias, o resultado é excelente. [...]

 

Notas:

[1] In his own write (1964) e A spaniard in the works (1965). [2] Em português algo como Os doidos do nonsense: de Lewis Carroll à Woody Allen. [3] A expressão bouillon d’onze heures, ao pé da letra caldo das onze-horas, é uma expressão que designa “bebida envenenada”. [4] N. do t.: tradução para o português de En flagrant délire, título francês do livro In his own write, de John Lennon. [5] N. do t.: Irmãos Marx, mítico grupo de comediantes, famoso por suas comédias absurdas e delirantes. [6] N. do t.: provavelmente à época Benayoun não dispunha da informação de que Lennon frequentou o Liverpool College of Art.

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